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DE CROCODILA À TAUBATÉ: Ratos de Porão, Questions e Sub Mídian no Porca Miséria

24099657_1545281848886065_1923189591_nCaminhando sozinho numa segunda-feira de manhã chuvosa, tento buscar na memória qual foi a primeira música da banda Ratos de Porão que ouvi na minha vida. Concluo que foi em 1999, pelas ondas da extinta MTV Brasil, no clipe da música “Crocodila”, do disco Carniceria Tropical (1997).

De lá para cá, meu gosto por música pesada foi sendo alimentado por diversas bandas e estilos, e o Ratos de Porão sempre ali, presente, mas demorou para que eles se tornassem uma das minhas bandas favoritas. Aliás, meu consumo musical obscenamente volumoso me impede de eleger uma banda favorita. São muitas. Mas o RDP merece um destaque.

Mesmo com esses 18 anos separando o presente daquele primeiro contato com a banda, eu nunca havia visto um show dos caras. Já houve oportunidades, claro, eles já tocaram em minha cidade ou localidades próximas, mas as circunstâncias me afastaram de um dos shows mais pesados e barulhentos do rock brasileiro.

Eis que no último fim de semana, eles tocaram em Taubaté. Eu havia comprado os ingressos com mais de um mês de antecedência – à preços módicos, vale ressaltar – e fui com minha esposa conferir.

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O show aconteceu no Porca Miséria, casa que é uma das poucas que tem recebido shows de punk/hardcore na cidade nos últimos anos. Como era de esperar, a noitada reuniu um público bem variado. Punks, metaleiros, headbangers em geral e curiosos marcaram presença. Confesso que estava ansioso para ver esses caras que colecionam 33 anos de atividade, muitos discos, turnês no exterior, polêmicas e causos. Eles são a história musical viva diante de nossos olhos.

Não me atentei para quantas músicas eles tocaram. Foram muitas. Não marquei quanto tempo durou o show. Foi longo. Foi, creio, um dos shows mais barulhentos que já fui – está pau a pau com o show do Motorhead que assisti em 2009 em termos de decibéis marretando meus tímpanos.

Brutal, violento, rápido, visceral, atormentador e libertador. Soa como clichê, mas tem de ser dito: veteranos como João Gordo, Jão (subestimado como guitarrista, toca demais) e Boka (melhor baterista do hardcore brasileiro, é hipnótico vê-lo tocar numa velocidade alucinante!), todos na casa de 40 e 50 anos, judiados pelos tantos anos de excessos do rock, executando músicas numa velocidade absurda. É de impressionar e de aplaudir. O baixista Juninho, o mais novo do grupo e que entrou na banda em meados dos anos 2000, é o sangue novo que dá ainda mais vitalidade à banda.

Como um todo, o Ratos de Porão me impressionou. Não posso dizer se o show foi ótimo, bom, regular ou ruim. Isso fica em segundo plano, é tema para comentaristas que já os viram ao vivo mais de uma vez.

Fato é que Taubaté, uma terra onde shows de rock sempre foram e continuam cada vez mais raros, o encontro com Ratos de Porão, e ainda as bandas Questions e Sub Midian, também veteranas do underground nacional, revitalizam a cabeça da galera.

Na saída, minha esposa Talita e eu vimos João Gordo, de trás de um gradil, atendendo alguns fãs, tirando fotos e xingando um cidadão que queria abraça-lo. A cena, cômica, nos chamou a atenção e resolvemos assistir a sessão de tietagem. Foi curta, e logo João se viu parado, sozinho, sem ninguém para bajulá-lo ou irritá-lo, dependendo do ponto de vista de humor do velho vocalista.

Ele olhou para nós, acenou com a mão, chamando. Minha esposa foi, eu não estava a fim de tirar foto nenhuma com ele, pois já havia lido diversas vezes que o cara não gosta de tirar fotos. Mas a insistência dele foi tamanha que acabei indo. Batemos a foto, e para não ficar só nisso, Talita, na melhor das intensões, puxou assunto para constar algum tipo de interação com o cara.

Não rendeu muita coisa, além de uma conversa que parecia em código, intercalado com uma meia dúzia de “foda-se”. João Gordo é assim, personagem pop e multimídia que faz sucesso em TV, Youtube e rádio, mas que por vezes não interage com o público no show com a mesma desenvoltura que tem nas câmeras.

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Eu, Talita e João Gordo

De qualquer forma, está aí, sobrevivente, com 33 anos de Ratos de Porão e ainda levantando bandeiras que merecem ser carregadas, como a do combate ao neofascismo que se espalha principalmente pela internet e da música feita de forma honesta e relevante.

Vida longa aos Ratos de Porão. Eles ainda merecem ser ouvidos, mesmo que isso lhe renda um ou dois dias de surdez parcial por conta da monstruosidade de seu som.