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O LOBO AUTÓFAGO

Por Leonardo Vinhas*

PRELÚDIO DO ENTREVISTADOR:
“O Alternative Voices foi um fanzine impresso que circulou no Vale do Paraíba e em São Paulo entre 2000 e 2003. Fiz parte dele da segunda à última edição. Na edição 9, lançada em 2002, fiz uma entrevista com Lobão após uma apresentação no SESC Taubaté em que ele promovia o álbum ‘A Vida É Doce’. Na época, Lobão defendia que os artistas deveriam todos se desvincular das grandes gravadoras e publicar seus trabalhos de forma independente.

‘A Vida é Doce’ foi comercializado em bancas de jornais, com grande repercussão midiática, e vendas alegadas de 100 mil unidades. Durante este período, Lobão e Caetano Veloso iniciaram uma briga midiática que só se encerrou com uma entrevista ‘deixa disso’ publicada na revista Trip.

Nesse contexto, foi realizada a entrevista”

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Chove lá fora e aqui… Aqui no SESC Taubaté o Alternative Voices entrevista João Luis Woerdenbag, o Lobão. Sem camarim, o atual ícone do mundo independente e rock star nos anos 1980 foi entrevistado atrás do palco, entre seguranças e algumas dezenas de fãs.

Entrevistar Lobão não é uma tarefa simples. Verborrágico, não deixa muitas chances para os interlocutores participarem da conversa e tampouco é receptivo a opiniões contrárias às suas. Porém, isso produz resultados reveladores sobre um personagem tão controvertido. Começo perguntando sobre sua geração, a geração dos anos 80, mas não tenho chance de concluir a pergunta.

“Anos 80? Que anos 80, eu não sou dos anos 80! Sou de 70! 70! Eu sou das antigas. Não venham me associar com rock, com essa coisa (faz cara de nojo) chamada ‘rock brasileiro’. Não tenho nada a ver com isso, não quero estar junto desses caras. Faço música para estar ao lado de Chico Buarque, Pixinguinha, não de Lulu Santos, porra!”

A partir daí, Lobão aproveitou todas as chances para falar mal da geração dos anos 80 (Herbert Vianna incluído, para variar) e para afirmar que “não faz rock”. Lobão se considera “um músico, um artista, não um roqueiro”. Realmente, uma audição superficial de seu trabalho comprova sua versatilidade. Mas o formato rock foi largamente explorado por ele e foi exatamente esse formato que o consagrou. Além disso, suas apresentações ao vivo têm uma forte característica de rock. Não tem rock nessa história, Lobão?

“Não! Eu não sou colonizado! Rock é música americana, e eu faço música brasileira!” Sim, Lobão não é colonizado, mas usa calças jeans, tem canções com título em inglês, grava canções em compasso de hard rock farofa… “É claro que tenho uma influência”, ele diz, “não dá para negar o passado, mas não deem um nome americano para minha música. Eu gosto de fazer barulho, chamem de barulho, porra!” Certo, o problema é o rótulo? “É!” Então tá.

Para sair da redundância, pergunto a Lobão se foi desconfortável estar junto a Caetano Veloso, a quem ele muito critica há anos, numa entrevista para a revista Trip. “Não, claro que não, porra, fui eu que aceitei fazer essa entrevista, eu que quis fazer”.

Tudo bem, mas se você quer se manter longe da mídia, por que você quis isso, ainda mais com um desafeto como Caetano? “Desafeto, não. Eu adoro o Caetano. Não gosto de algumas coisas que ele andou fazendo, mas, porra, o cara tem história, tem um trabalho de qualidade. E eu que quis isso para acabar com essa babaquice na mídia. Ele fez uma menção a mim que eu não gostei (na música “Rock’n’Raul”) e eu fiz uma resposta na música ‘Para o Mano Caetano’, que eu, diga-se de passagem, achei muito boa. E é isso, tá acabado”.

Já meio cansado de explicar suas próprias contradições (chegou a se recusar a responder quando perguntado se a sua luta contra as grandes gravadoras funcionava como marketing pessoal também), o Lobo é tranquilizado com amenidades. Informa que seu novo disco ao vivo será comercializado este ano ao preço de R$ 9,90 nas bancas, que seu selo Universo Paralelo não vai lançar nenhum outro artista além dele próprio (“não sou empresário”), que atualmente anda ouvindo muita música clássica brasileira, que tem feito cinco shows por semana… E tornou a se bravatear, a declarar que não faz rock, que não é colonizado, que Caetano Veloso força a barra, que Lulu Santos acha que o público é coprófago etc.

Um dos maiores entertainers do pop brasileiro, Lobão dá declarações polêmicas, compra brigas nem sempre produtivas e se posiciona inflexível independente das contradições envolvidas em alguns de seus conceitos. Mas possui muito carisma e não raro faz apresentações memoráveis ao vivo (como a ocorrida em 18/11 no SESC). E só o fato de ter arrotado na cara das grandes gravadoras a possibilidade de ganhar dinheiro com um trabalho de qualidade fora dos esquemas mercenários das corporações já confere respeito de sobra ao cara. Mesmo que ele não seja um ideólogo dos mais coerentes.

*Leonardo Vinhas é jornalista e escritor. Nasceu em Taubaté (SP) e reside atualmente em Florianópolis (SC). Escreve sobre música, literatura e quadrinhos desde 1999. Passou por diversas redações e foi coordenador de Operações de Imprensa para o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo FIFA 2014 em Curitiba.

Don Drummond: magnífica obra e fim trágico na loucura

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No último dia 6 de maio completaram 45 anos da morte de um dos maiores gênios do Ska jamaicano. Em 1969, enquanto a ilha estava fervendo com um novo ritmo chamado Reggae, o trombonista Don Drummond morria na pior, aos 37 anos, agonizando em um sanatório.

Drummond nasceu em Kingston, Jamaica, em 1932. Sua carreira musical começou em meados da década de 1950, com os Eric reitores All-Stars. Sua biografia musical tem como principal destaque o fato de ter feito parte da lendária banda Skatalites, que até hoje está na ativa. Don Drummond foi um dos principais compositores do grupo nos anos 60, e participou da “grande explosão” do Ska em terras jamaicanas.

Dom Drummond ganhou status de estrela da música em seu país, e chegou a ser classificado pelo pianista George Cisalhamentro como um dos cincos melhores trombonistas de todo o mundo. No entanto, quando gozava de prestígio por sua música, passou a sofrer com problemas mentais.

No Ano Novo de 1965 o músico sofreu um ataque de ciúmes e esfaqueou sua namorada, a dançarina exótica Anita “Margarita” Mahfood, que veio a falecer. Don Drummond se entregou à polícia e confessou o crime.

O músico foi internado no Los Belle Vue Asilo, em Kingston, onde permaneceu até sua morte. A causa oficial do óbito que foi divulgada na época foi “suicídio”. No entanto, há teorias alternativas. A principal delas é de que ele teria sido morto por gangsters, como vingança pelo assassinato de Anita Mahfood.

Amplamente aceito como um gênio musical, Drummond nos deixou mais de 100 composições, que continuam a impressionar pela riqueza sonora e servirão como peças de estudo para músicos atuais e futuros que queiram entender as raízes da música jamaicana.

Abaixo um dos sons mais clássicos do gênio Don Drummond:

 

*Fonte: Move On Sound (clique aqui para visitar a página)

13 anos sem Joey Ramone

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Ramoníacos de todo o mundo lembram nesta terça-feira, 15 de abril os 13 anos da morte de Joey Ramone, lendário vocalista dos Ramones, a maior banda punk de todos os tempos.

Se os Ramones revolucionaram o rock no meio dos anos 1970, levando o estilo a níveis de velocidade nunca antes vistos, e criando uma estética visual própria – quem não se lembra das jaquetas de couro, cabelos compridos e calças rasgadas? – Joey foi o símbolo mais querido disso tudo.

Nascido Jeffrey Ross Hyman, em 19 de maio de 1951, Joey era fã da sonoridade dos anos 60. Beatles, Beach Boys, e grupos vocais como The Ronnetes formaram o arquivo musical de Joey, o que podem explicar a capacidade dos Ramones fazerem canções poderosas, velozes, mas ao mesmo tempo melodiosas.

O vocalista nasceu em Nova York, e por lá sempre viveu. Na fase final de sua vida, morava na rua 9, a poucos passos de St. Mark’s Place e do Bowery, no meio do burburinho alternativo de Nova York. Era a região dos clubes– Continental, Coney Island High e, claro, o lendário CBGB’s, onde os Ramones fizeram sua fama nos primeiros anos.

No bairro havia também incontáveis lojas de disco e DVDs. Joey estava em casa. Não era difícil encontrá-lo andando pela rua ou checando a Kim’s Video atrás de algum filme de terror bizarro. O gigante do punkrock fazia parte da paisagem local.

Na virada do século, Joey Ramone lutava um linfoma. Sua saúde frágil foi uma das razões para o fim dos Ramones, em 1996. O cara não aguentava mais excursionar. Mas mesmo após a banda encerrar as atividades, ele continuou ligado à música, mesmo que de forma mais contida.

Fazia shows, produziu um disco de Ronnie Spector e dava a maior força para uma banda chamada The Independents, de quem era fã.

A morte de Joey Ramone, em 15 de abril de 2001 causou comoção geral. Era o primeiro dos Ramones a falecer – Dee Dee morreria no ano seguinte, e Johnny dois anos depois. Sua morte deixou o início do século XXI mais triste, em especial para quem tinha os Ramones como trilha sonora pessoal.

Pouco depois de sua morte, em 2002, foi lançado seu primeiro disco solo/póstumo, muito bom, por sinal. “Don’t Worry About Me” carrega muito do que Joey representava para a banda que liderou por tantos anos. Considero inclusive esse disco uma extensão da discografia dos Ramones.

Hoje é dia de lembrar. Mas sem tristeza. Vou é ouvir os três primeiros discos dos Ramones na sequência, e finalizar o dia com o isco ao vivo “It’s Alive”. Pela memória de Joey Ramone, três acordes e som alto, é o que preciso.

MÚSICA: três minutos com os Clarendonians

Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin no início da carreira em foto promocional para um de seus lançamentos em disco

Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin no início da carreira em foto promocional para um de seus lançamentos em disco

Os Clarendonians eram originalmente Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin (que depois viria a gravar como integrante do grupo The Soul Lads). Ambos são da Jamaica, e se conheceram na Paróquia de Claredon.

A parceria começou para valer em 1963, vindo a render vários prêmios em concursos de talentos. O single de estreia dos Clarendonians veio em 1965, com a música “A Day Will Come”, produzida por Leslie Kong. Até hoje a faixa é um marco do Ska jamaicano sessentista.

Detalhe da etiqueta do single de estreia dos Claredonians, de 1965

Detalhe da etiqueta do single de estreia dos Claredonians, de 1965

Eles chamaram a atenção do Studio One, dirigido por Clement Dodd, enquanto eles ainda estavam no início da adolescência. Dodd levou a dupla para o estúdio e gravou uma série de singles, incluindo “Rudie ido um Jail”, “Sho Be Do Be”, “Rudie Bam Bam”, “You Can’t Be Happy” e “Darling Forever”. Todas essas canções chegaram ao topo das paradas na Jamaica.

Outra faixa decisiva para a consagração dos Clarendonians foi “You Can’t Keep a Good Man Down”, que ajudou a definir a era do Rude Boy no ska jamaicano.

Em dado momento, o produtor Clemente Dodd decidiu expandir os Clarendonians de dueto para um trio, levando para a banda Freddie McGregor, então uma criança de apenas 7 anos, que mal alcançava o microfone, e precisava até mesmo subir num caixote para conseguir gravar seus vocais em estúdio.

Austin, um dos Clarendonians, passou a se mostrar insatisfeito com o trabalho do produtor Clement Dodd no final da década de 1960 e decidiu começar um trabalho solo, gravando faixas para o produtor Ken Lack. Chegou ainda a trabalhar gravando algumas músicas para o produtor Phil Pratt , mas não conseguiu igualar o sucesso de seus colegas.

 

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Vale lembrar que especialmente na década de 1960, artistas de ska, rocksteady e reggae existiam aos montes na Jamaica, terra-mãe dos estilos. Por isso, a concorrência era enorme, e os artistas trabalhavam duro apostando em bons singles, que caso fossem bem executados pelas rádios, poderiam lhes render mais trabalho pelos próximos meses.

Voltando à história de Peter Austin, ele deixou a música de lado e passou a trabalhar como supervisor de aviação no Aeroporto Internacional Norman Manley.

Enquanto isso, seu antigo parceiro Ernest Wilson conseguiu se estabelecer como artista solo, com singles como “Storybook Children” e “If I Were a Carpenter”. Peter Austin chegou a se apresentar por algum tempo com o nome artístico de ‘King Shark’, e continuou a fazer sucesso esporádico até meados da década de 1990.

Freddie McGregor – o menino de 7 anos – cresceu, e levou algum tempo para se estabelecer como um artista solo, trabalhando no Studio One como um baterista de sessão e fazendo backing vocals para outros artistas. Consegui emplacar um sucesso com o single “Bobby Bobylon”, e desde o final da década de 1970 tem sido um nome respeitadíssimo do reggae.

originalmente Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin, os originais The Clarendonians, em foto de 2013

originalmente Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin, os originais The Clarendonians, em foto de 2013

Fitzroy Wilson e Peter Austin reformaram o The Clarendonians na década de 1990 e em 2013 promoveram um show de celebração do 50º aniversário do grupo.

Depois de tudo isso, aqui um dos meus sons favoritos do The Clarendonians, “Lick It Back”. São cerca de três minutos de música reconfortante, melodia poderosa que reflete toda a mística de uma época de ouro da música jamaicana. Vida longa aos rude boys.

Dez Discos que Corromperam Minha Alma

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Recentemente, navegando pelo mundinho podre, sujo e viciante do Facebook, me deparei com uma mania de alguns amigos fanáticos por música. A brincadeira consiste em fazer um Top 10 de álbuns que marcaram a sua vida por algum motivo.

A maioria, claro, era tão tarada por música que fizeram listas que extrapolaram 10 títulos. Um outro vez uma dezena de rankings, outro fez vários Top 10 separados por estilo. Enfim, para nós que amamos e colecionamos música, fica difícil escolher só 10 discos. É como uma mãe escolher um filho predileto.

Mas decidi fazer um exercício mental e escolher 10 discos que tenham sido relevantes na minha vida por algum motivo. Foi difícil, claro. Montei então uma listinha de 10 discos que marcaram minha existência. Não estão ordenados por importância, nem por data de lançamento. Tentei dar uma sequência lógica tendo como referência a idade com que escutei/adquiri o disco, explicando o motivo do mesmo ter um espaço especial no meu coração musical. Os anos destacados entre parênteses fazem referência a quando os discos foram lançados. Para cada disco, destaco também uma faixa para ilustrar musicalmente este texto. Vamos lá:

green-day-dookie-jpgGreen Day – Dookie (1994)

Primeiro disco de punkrock que tive contato. Na verdade era uma fita K7 do meu irmão. Era 1996, eu então com 11 anos de idade pegava a fitinha escondido para ouvir. Decidi fazer uma cópia, que rodou milhões de vezes no meu rádio. Tenho a fita até hoje, e a guardo com muito cuidado. Somente há alguns anos que achei o CD numa promoção de usados e o adquiri. Velocidade, melodias pegajosas e a energia inconfundível do punkrock noventista norte-americano. O que mais um moleque precisa para se apaixonar por rock?

 

 

raimundosRaimundos (1994)

Por volta de 1997 comecei a ter contato com outras bandas de rock, e o que já rolava pelas rádios e walkmans da galera incluía uma certa banda chamada Raimundos. O primeiro disco deles que ouvi foi, na verdade, “Lavô Tá Novo”, que é o segundo álbum. Mas o primeiro CD original que comprei foi o disco de estreia dos caras, de 1994. A capinha marrom é mítica, e levar um CD dos Raimundos para casa era quase como comprar uma revista pornô! Tinha emoção naquilo. São 16 faixas de peso e velocidade, uma gravação meio suja, com o baixão estalando nos ouvidos. Coisa linda. Quem não foi feliz ouvindo o Raimundos clássico?

 

Ramones - 1996 - Greatest Hits Live(Capa)Ramones – Greatest Hits Live (1996)

A maneira como conheci os Ramones também é engraçada. Já fã de Raimundos, mas ainda bem moleque, sempre lia, escutava ou assistia entrevista dos caras dizendo que a maior influência deles eram os Ramones. Decidi então ir atrás e conhecer a tal banda que eles tanto falavam. Foi como sair da pré-escola e se juntar aos garotos mais velhos da escola. Achei esse CD numa loja de departamentos. Na verdade trata-se de um disco ao vivo, gravado em Nova Iorque, e lançado por um selo brasileiro como se fosse uma coletânea. A primeira audição foi chocante. Ramones ao vivo não é para principiantes. Creio ter “não-gostado” do CD durante todo o primeiro mês que tentei ouvi-lo. Mas logo a viadagem juvenil passou e eu estava pirando no “one, two, three, four” e na velocidade alucinante dos caras executando os clássicos ramonianos. Ainda hoje escuto esse disco quando me sinto entediado. Sempre funciona.
 

 

INOCENTES - garotos de subúrbioInocentes – Garotos do Subúrbio (1999)

Já familiarizado com a sonoridade punk, era hora de me embrenhar nas letras de protesto. Lembro de ter escutado os Inocentes num programa da extinta rádio Brasil 2000, de São Paulo. Fui até a loja especializada em rock da minha cidade, Beco do Disco – que existe até hoje (alô André Ferrarezi, merchandising grátis aqui). Lá encontrei uns três títulos da banda, simpatizei com a capa, vermelha e preta, com os desenhos, e tinha várias faixas. Arrisquei, na pior das hipóteses, ao menos alguns sons seriam legais. Certeiro, conheci e passei a admirar a banda que julgo ser uma das melhores do país, e que tem no vocalista Clemente o melhor letrista do punk brazuca. Depois desse CD, o punk brasileiro passou a ter um espaço especial nos meus arquivos musicais. “Rotina”, “Ele disse não”, “Pânico em SP”, “Liberdade condicional”, “Expresso oriente” e “Garotos do Subúrbio” são hinos.

rock-de-suburbio-liveGarotos Podres – Rock de Subúrbio (1995)

Nem imagino como fiquei sabendo que existia algo tão toscamente genial como os Garotos Podres. Só sei que um dia fui até a mesma loja já citada aqui com o intuito de comprar algo deles. Perguntei à vendedora qual era o mais legal. Ela disse: “todos são bons”. Pensei: “porra, impossível isso, ela não manja e tá querendo me empurrar qualquer merda”. Erro meu. Viria a constatar no futuro que todos os discos da banda são realmente bons. Minha estreia foi ouvindo este que é o primeiro registro ao vivo dos Garotos Podres ao vivo. Gravado num bar em Mauá(SP), cidade natal do grupo, o registro é visceral. Reunindo os petardos dos três primeiros álbuns, o show é encardido, pesado, intimista, violento e divertido. Foi tiro e queda, e os Garotos Podres entraram na minha vida para nunca mais sair. Infelizmente a banda acabou, e o vocalista Mao está movendo uma ação judicial contra os ex-integrantes Sukata (baixo) e Capitão Caverna (bateria) por estarem usando indevidamente o nome do grupo, inclusive tentando agendar alguns shows e gravando músicas novas com outro vocalista. Prometo em breve escrever sobre o caso, trazendo inclusive as palavras do próprio Mao a respeito do triste fim do Garotos Podres.

 

aberraçõesZumbis do Espaço – Aberrações que Somos (2002)

A primeira vez que tive contato com os Zumbis do Espaço, clássica banda de punk-horror brasileira, foi por uma capa de um caderno de um amigo no colégio. Lá estava colado um velho adesivo, com o logotipo da caveira usando cartola, que era parte da identidade visual do grupo nos primeiros anos. Perguntei do que se tratava, ele resumiu: “é uma banda de punkrock, letras sobre terror. O vocalista é de Taubaté”. Acho que o regionalismo falou alto, e por ser da mesma cidade de um dos caras da banda fui atrás. Curti logo de cara, e anos depois eles lançaram este que considero ser um dos melhores discos da carreira deles. “Aberrações que Somos” foi o CD que colocou os Zumbis do Espaço num posto diferenciado do rock independente nacional. Musicalmente o disco é poderoso, recheado de sons que se tornariam hits, executados até hoje nas apresentações ao vivo e cantados em coro pelos fãs. “A marca dos 3 noves invertidos” é, para mim, a melhor música de toda a carreira dos Zumbis. O disco foi tão aclamado que tornou-se item esgotado no fim dos anos 2000. Sabiamente, a banda o relançou em versão digipack, com algumas faixas extras, e posteriormente lançou edição limitada em vinil colorido. Tenho todas as versões, e escuto periodicamente esse clássico dos infernos.

 

Ska BrasilSkabrasil – Skarnaval (1997)

Hoje sou fã de Ska. Esse ritmo meio incompreendido, muito pop para ser underground, e ao mesmo tempo muito alternativo para ser pop, me conquistou. A forma como passei a escutar Ska foi também estranha, e novamente teve participação direta da banda Raimundos. Escutando o primeiro disco dos caras, uma frase na música “Marujo” me chamou a atenção: “Aprende a mexer no leme e as batatas descascar / Ele tem um headphone onde só toca Ska”. Como eu já conhecia o termo, resolvi buscar alguma coisa para escutar. Lembrei então que meu irmão André, o mesmo da fita K7 do Green Day, havia comprado há alguns anos atrás a coletânea “Skabrasil”, lançada em 1997 pela Paradoxx. Lá estavam as bandas Skuba, Boi-Mamão, Manuels, Mr. Rude e Skamoondongos. Audições seguidas no meu quarto foram fazendo com que passasse a entender o que era o Ska. Foi um ponto de partida importante, pois por meio de referências tiradas de algumas letras contidas nessa coletânea, conheci o Ska original jamaicano, com artistas como Desmond Dekker, Maytals, Skatalites, dentre outros.

 

ElvisElvis Presley – The Best Of Elvis – Good Rockin’ Tonight (1989)

De uma só vez fui cooptado por Elvis Presley e pelo Rockabilly. Tudo começou quando escutei alguns sons de rockabilly numa coletânea qualquer. Minha irmã havia me presenteado com um toca-discos e com alguns discos de sua coleção. Lá no meio estava esta coletânea dupla, lançada no Brasil em 1989. Entre as músicas mais primitivas do Elvis, há rockabilly, e por isso passei a escutá-lo com freqüência. Com o tempo, até mesmo as baladas românticas do Rei me agradavam. Passei a ser bem fã de Elvis Presley, e a coleção de vinis dele já passa dos 30 títulos. Elvis é indispensável, foi um radical, um punk de sua época, e apesar do fim trágico e melancólico, foi um dos maiores personagens do século XX. E esse disco mudou a minha vida.

motorhead+ace+of+spadesMotorhead – Ace Of Spades (1980)

O que falar do Motorhead? Difícil. Banda ícone do rock’n’roll que consegue fazer um som que mistura punk e metal, agradando a todo tipo de maluco fã de um bom barulho. Não sei exatamente quando comecei a colecionar discos do Motorhead, mas “Ace Of Spades” foi o segundo vinil dos caras que eu comprei. Era meados dos anos 2000, o mercado de discos usados ainda estava em baixa, pois a moda do retorno do vinil ainda não tinha embalado como agora. Lembro de ter pagado uns R$ 15,00 no discão, original da época, em ótimo estado de conservação. Cheguei em casa, botei pra rodar e não teve como não balançar a cabeça ao som de “Ace Of Spades”, a faixa título desse que é um dos álbuns essenciais para se curtir e entender o rock. Como não pagar um pau para a capa com os caras vestidos de pistoleiros, como se fossem vilões de um western de qualidade duvidosa? Sem Lemmy Kilmister e o Motorhead, as coisas provavelmente não seriam as mesmas.

 

Reign_in_blood_-_slayer_-_1986Slayer – Raining Blood (1986)

Para encerrar, deixo o último disco que fez algum efeito de mudança na minha vida. Dá até vergonha de expor isso aqui, mas só fui escutar Slayer depois de “velho”. Nunca havia dado muita atenção pra banda, apesar de conhecê-la desde 1998. Por anos fui meio que um militante do punkrock, e deixei que o preconceito besta de moleque me afastasse do metal. Depois de assistí-los no Rock In Rio 2013 me senti um bosta por não ter nenhum disco dos caras. Fui até a loja e joguei na segurança. Comprei “Raining Blood”, não à toa um dos discos mais cultuados do metal. Slayer é uma banda do capeta, faz música do mal e serve para exorcizar os fantasmas da alma. Prova desse poder foi ter causado algum tipo de mudança na minha vida, mesmo depois de anos e mais anos comprando e ouvindo rock. Se mudou para melhor ou para pior, não sei, só sei que tenho ouvido Slayer quase todo dia.

 

 

 

 

MÚSICA: três minutos com The Clarendonians

Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin no início da carreira em foto promocional para um de seus lançamentos em disco

Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin no início da carreira em foto promocional para um de seus lançamentos em disco

Os Clarendonians eram originalmente Fitzroy “Ernest” Wilson e Peter Austin (que também iria gravar como parte do grupo The Soul Lads). Ambos são da Jamaica, e se conheceram na Paróquia de Claredon.

A parceria começou para valer em 1963, vindo a render vários prêmios em concursos de talentos. O single de estreia dos Clarendonians veio em 1965, com a música “A Day Will Come”, produzida por Leslie Kong.

 

Detalhe da etiqueta do single de estreia dos Claredonians, de 1965

Detalhe da etiqueta do single de estreia dos Claredonians, de 1965

 

Eles chamaram a atenção do Studio One, dirigido por Clement Dodd, enquanto eles ainda estavam no início da adolescência.

Dodd levou a dupla para o estúdio e gravou uma série de singles, incluindo “Rudie ido um Jail”, “Sho Be Do Be”, “Rudie Bam Bam”, “You Can’t Be Happy” e “Darling Forever”.

Todas essas canções chegaram ao topo das paradas na Jamaica. Outra faixa decisiva para a consagração dos Clarendonians foi “You Can’t Keep a Good Man Down”, que ajudou a definir a era do Rude Boy no ska jamaicano.

Em dado momento, o produtor Clemente Dodd decidiu expandir os Clarendonians de dueto para um trio, levando para a banda Freddie McGregor, então uma criança de apenas 7 anos, que mal alcançava o microfone, e precisava até mesmo subir num caixote para conseguir gravar seus vocais em estúdio.

Austin, um dos Clarendonians, passou a se mostrar insatisfeito com o trabalho do produtor Clement Doddno final da década de 1960 e passou a gravar como artista solo para o produtor Ken Lack. Ele chegou ainda a trabalhar gravando algumas músicas para o produtor Phil Pratt , mas não conseguiu igualar o sucesso de seus colegas.

Especialmente na década de 1960, artistas de ska, rocksteady e reggae existiam aos montes na Jamaica, terra-mãe dos estilos. Por isso, a concorrência era enorme, e os artistas trabalhavam duro apostando em bons singles, que caso fossem bem executados pelas rádios, poderiam lhes render mais trabalho pelos próximos meses.

Voltando à história de Peter Austin, ele deixou a música de lado e passou a trabalhar como supervisor de aviação no Aeroporto Internacional Norman Manley.

Enquanto isso, seu antigo parceiro Ernest Wilson conseguiu se estabelecer como artista solo, com singles como “Storybook Children” e “If I Were a Carpenter”. Peter Austin chegou a se apresentar por algum tempo com o nome artístico de ‘King Shark’, e continuou a fazer sucesso esporádico até meados da década de 1990.

Freddie McGregor – o menino de 7 anos acrescido ao grupo pelo produtor Dodd – cresceu, e levou algum tempo para se estabelecer como um artista solo, trabalhando no Studio One como um baterista de sessão e fazendo backing vocals.

Consegui emplacar um sucesso com o single “Bobby Bobylon”, e desde o final da década de 1970 tem sido um nome respeitadíssimo do reggae.

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Fitzroy Wilson e Peter Austin, os Clarendonians, em foto tirada em 2013, anos de celebração do 50º aniversário do duo.

Fitzroy Wilson e Peter Austin reformaram o The Clarendonians na década de 1990 e em 2013 promoveram o 50º aniversário do grupo.

Depois de um pouco da história do The Clarendonians, aqui um dos meus sons favoritos do conjunto, “Lick It Back”. São cerca de três minutos de música reconfortante, melodia poderosa que reflete toda a mística de uma época de ouro da música jamaicana. Vida longa aos rude boys.

MEMÓRIA: Carbonário, rebeldia 100% brasileira

Se tem uma coisa boa que a internet nos proporcionou na última década foi a criação do site Youtube. Por meio dessa valiosa ferramenta muita coisa do som punk/Oi!/Ska, especialmente nacional, foi resgatado e compartilhado com quem viaja pela rede.

Um desses tesouros é o vídeo que registra um ensaio caseiro da banda Carbonário, de Campo Grande (MS). O registro foi colocado na internet por Oswaldo Jr., ex-vocalista/guitarrista da banda. Assista:

Carbonário foi um grupo de Oi! Nacionalista, fundado em 1988 e que fez a cabeça dos fãs do gênero durante a década de 1990, mesmo sendo uma banda de fora do eixo sul-sudeste, que no geral abrigou e abriga as principais bandas brasileiras do gênero.

A banda Carbonário levantava, sem medo, a bandeira do nacionalismo, do anti-estrangeirismo e do anti-racismo (sim, é possível ser anti-racista e nacionalista ao mesmo tempo, escute algumas músicas deles e comprove).

Carbonrio+carb2

O grupo, no entanto, nunca conseguiu lançar um álbum completo. Seus registros se resumem a uma demo, e apresentações ao vivo gravadas de forma amadora. Esses materiais viraram fitas K7 que circularam intensamente entre a galera. Com o advento do MP3, esses sons estão disponíveis na internet, é só procurar.

Ainda nos anos 1990, graças ao trabalho de Luis Português, ex-baterista do Garotos Podres, e do escritor Glauco Mattoso, o selo Rotten Records, de propriedade dos dois citados, lançou o Carbonário pela primeira vez em CD. Sua primeira aparição pelo selo foi na coletânea Urbanoise, de 1996 com as faixas “Eu quero saber”, “Carbonário” e “O que eu fiz?”.

Capa da coletânea Urbanoise, lançada pela Rotten Records em 1996.

Capa da coletânea Urbanoise, lançada pela Rotten Records em 1996.

Depois, eles voltaram a figurar na Urbanoise vol. 2, de 1998, com as faixas “Pela Nação” e “Soberania”.

Urbanoise vol. 2, de 1997, outra coletânea do selo Rotten Records em que a banda Carbonário figurou nos anos 1990

Urbanoise vol. 2, de 1998, outra coletânea do selo Rotten Records em que a banda Carbonário figurou

Em 2000, a Rotten records reuniu todas essas faixas lançadas nas duas coletâneas anteriores, mais duas versões de sons do Carbonário gravados por outras bandas: “Lumbriguete”, tocada pela Patriotas e lançada originalmente na coletênea Oi! Um Grito de União vol. 2 (Rotten Records, 1996), e “Carbonário”, gravada pela banda capixaba The Skulls, e lançada originalmente em seu álbum “Gigantes do Brasil” (Oi! Brasil Records, 2000). Esse material todo entrou num CD Tributo/Split que reuniu o Carbonário e a banda francesa The Herberts.

Tributo da Rotten Records ao Carbonário e à banda francesa The Herberts, lendária representante do Oi! europeu

Tributo da Rotten Records ao Carbonário e à banda francesa The Herberts, lendária representante do Oi! europeu

Esses CD’s hoje estão fora de catálogo, mas podem ser encontrados em sebos, ou via colecionadores. A coletânea Urbanoise vol. 2 ainda é achada até mesmo em grandes lojas online, como Americanas.com (clique aqui para comprar o CD).

Se preferir, esses discos estão disponíveis para download nos blogs espalhados pela vastidão da rede mundial de computadores. Ficarei devendo links para que você baixe esses discos todos citados nesse texto.

De qualquer forma, fica aqui o registro histórico dessa banda que foi uma das que levantou a bandeira do Oi! brasileiro. Se por um lado o som e principalmente as letras desagradam quem combate as idéias nacionalistas, por outro fica a lição de um grupo de caras que não tiveram medo de tocar e cantar suas idéias, e acima de tudo rechaçar a podre faceta do racismo, comum em tantas bandas que se auto-proclamam defensoras da Oi! Music.

Memória do Som: The Lurkers, ao vivo em Caçapava

Um dos marcos da minha vida como expectador de shows de punk rock foi quando descobri a lendária Posso! Skate Bar, em Caçapava (SP). O lugar funcionou de meados dos anos 1990 até começo dos anos 2000. Ficava a alguns metros da linha férrea que corta a cidade, bem em frente ao quartel do Exército.

A Posso! Skate Bar foi um dos locais de shows independentes mais celebrados de toda a região do Vale do Paraíba, e que mais bandas teve em seu acanhado palco. Sem dúvidas, esse pequeno bar que se tornou o reduto do punk/hardcore do Vale do Paraíba merece que sejam escritos livros a seu respeito, filmados documentários, e todo tipo de homenagem.

Era 2002, eu apenas um moleque adolescente que estava descobrindo uma infinidade de bandas legais. Fiquei sabendo à época que uma tal banda inglesa de punk rock estava em turnê pelo Brasil. The Lurkers era o nome dos velhotes que, por acaso, tinham show marcado para Caçapava, na tal Posso!.

Lurkers 2002

Não tive dúvidas, peguei um buzão em Taubaté, no domingo, logo após o almoço, e parti rumo à vizinha cidade. Usando uma velha camisa branca do Ramones, que de tanto eu usar já se deteriorou, estava lá na rodoviária de Taubaté, pronto para ir pela primeira vez naquele reduto punk que receberia um show de uma banda que faz parte da história do punk inglês.

Sobre o evento propriamente dito: aconteceu em 24/11/2002, um domingão à tarde, como era tradição na Posso!. A primeira banda a tocar foi a Jerks, de São José dos Campos. Depois, veio os paulistanos do Holly Tree, banda que nem existe mais, mas que naqueles tempos fez certo sucesso entre o público do punk rock. O show deles contou com a participação especial do guitarrista Jão, do Ratos de Porão, que tocou alguns clássicos de punk inglês da safra de 77. Muito foda, está fresco na minha memória até hoje.

Holly Tree, extinta banda paulista que abriu o show do Lurkers em Caçapava (SP), em novembro de 2002

Holly Tree, extinta banda paulista que abriu o show do Lurkers em Caçapava (SP), em novembro de 2002 (Foto: Arquivo Welington Dias/Gramophone)

A terceira banda de abertura foi a já veterana e bem conhecida no circuito underground Autoramas, do Rio de Janeiro, fazendo um som fortemente influenciado por surfmusic e coisas do tipo. Eles estão por aí até hoje, e reconhecidamente são um dos ícones do som independente no Brasil.

Eis que já a noite, sobem ao palco os ingleses do The Lurkers. Não era a primeira vez deles no Brasil. Em 2001 eles já haviam feito uma turnê por aqui, e gravado até um disco ao vivo “On Heat – Live in Brazil 2001” (lançado pelo selo Ataque Frontal). Eu havia conhecido a banda pelo extinto programa Musikaos, da TV Cultura, apresentado por Gastão Moreira. Portanto, já sabia que os caras eram bons.

Arturo Bassick, baixista e vocalista é uma figura incrível. Pançudo, sotaque londrino carregadíssimo, e muita simpatia. Ele, o guitarrista Rabid Kemp, e um baterista careca que já não era o mesmo da formação do disco ao vivo subiram ao acanhado palco da Posso! e detonaram um setlist recheado de ótimas canções, a maioria figurava no tal CD ao vivo, que eu viria a comprar nesse dia e escutar uma infinidade de vezes – soma-se a essa lista este momento em que escrevo este texto.

The Lurkers, tocando na Posso! Skate Bar, em Caçapava, em 24 de novembro de 2002 (Foto: Arquivo Welington Dias/Gramophone)

The Lurkers, tocando na Posso! Skate Bar, em Caçapava, em 24 de novembro de 2002 (Foto: Arquivo Welington Dias/Gramophone)

Aquele clima intimista, um show pequeno, de uma banda gringa, num boteco minúsculo como era a Posso!, tudo aquilo impressionou demais um moleque de 17 anos como eu. Era o punk rock ganhando de vez espaço na minha cabeça, e definitivamente aquele show do Lurkers era a melhor coisa que eu já havia assistido ao vivo. Voltar para casa todo suado, com o CD dos caras em mãos, e feliz por ter curtido um domingão punk foi uma sensação sem igual.

Tive a chance de vê-los ao vivo novamente, em 2003, de novo na Posso! Skate Bar, em Caçapava, quando inclusive tive a experiência mais louca ainda, que foi a de entrevistar Arturo antes do show. Mas essa história fica para outra coluna.

Se você estava lá, tem fotos ou causos envolvendo esse show, deixe seu comentário.

Se não conhece o The Lurkers, assista no vídeo abaixo a apresentação deles no Musikaos, da TV Cultura, em 2001. Eles tocam “Wolverine”, “GO Ahead Punk” e “Gotta Go”. Só clássicos.

MEMÓRIA – O Fim do Pit Stop

Há exatos 5 anos, acontecia a noite de despedida do bar Pit Stop, lendário reduto cervejeiro da comunidade universitária de Taubaté (SP). Localizado logo no início da Rua do Colégio, no bairro do Bom Conselho, a bodega dirigida pelo casal Valdir & Terezinha, empresários do ramo gastronômico que hoje trabalham com um restaurante de mesmo nome, ficou na história.

Um dos poucos registros fotográficos do Pit Stop que consegui pela internet. Alguns bebedores cativos em algum momento do ano de 2006. Atente para o preço da cerveja nos cartazes ao fundo (Foto: arquivo André Pires)

Um dos poucos registros fotográficos do Pit Stop que consegui pela internet. Alguns bebedores cativos em algum momento do ano de 2006. Atente para o preço da cerveja nos cartazes ao fundo (Foto: arquivo André Pires)

Especialmente entre os anos de 2004 e 2008, foi frequentada por uma geração de pessoas interessadas em cerveja barata, caos e socialização alcoólica. Inicialmente o lugar era apenas uma lanchonete/bar que recebia especialmente muitos funcionários dos Correios, que trabalhavam por perto e faziam seu “happy hour” por lá. Aos poucos, o pessoal das faculdades de Comunicação Social começou a frequentar o lugar, sendo seguidos tempos depois por estudantes de Psicologia e Educação Física. Mas no geral, era um lugar bem democrático, recebendo tudo quanto é tipo de gente.

Em agosto de 2008, Valdir anunciou que fecharia o botequim, por conta da necessidade de entregar o prédio ao proprietário. O lugar fora vendido para uma construtora, que ergueria um edifício residencial no lugar – o que realmente aconteceu.

A noite de 29 de agosto de 2008, uma sexta-feira, ficou marcada como a última em que o Pit Stop recebeu seus malditos clientes. Como o lugar seria demolido, as paredes foram totalmente tomadas por mensagens diversas, que iam de bregas declarações de amor ao bar, passando por desenhos infames e, claro, muita pornografia e palavrões.

Hoje, quem passa pelo Bom Conselho e olha para a esquina da Rua do Colégio, não vê nada mais além de um prédio sem graça. Uns dizem que o bar acabou quando tinha que acabar, outros lamentam até hoje a demolição e a definitiva extinção do Pit Stop. De certeza só fica uma: bebemos tudo o que tinha pra beber por lá. Afinal, como já diria aquela música, “bom é quando faz mal”.

Se você foi frequentador desta lendária bodega, deixe seu relato sobre algo engraçado ou que tenha te marcado envolvendo o Pit Stop.

MEMÓRIA DO SOM: Domingos de um 2002 Poético

Na coluna MEMÓRIA DO SOM de hoje começo a resgatar uma fase curta, mas muito rica de shows independentes em Taubaté, especialmente de bandas punk e hardcore. Entre 2002 e 2003 um dos principais locais onde as bandas tinham espaço para tocar em terras taubateanas era um local chamado Chopp do Poeta.

O espaço era um bar, estilo pub, com dois ambientes bem bacanas. O primeiro era consistido de um pequeno mezanino à direita de quem entrava na casa, com algumas mesas dispostas coladas à parede. No fundo, o bar e o caixa. Passando por uma porta, chegava-se ao que podemos chamar de pista de dança, e no fundão ficava o estreito palco. Do lado direito ficavam os banheiros. O Chopp do Poeta ficava na tradicionalíssima Rua XV de Novembro, no centro de Taubaté. Hoje por lá funciona uma maldita igreja evangélica, dessas tipo “caça-níquel-engana-trouxa”.

Pois bem, hoje falarei de dois eventos em um cartaz só.  Ambos aconteceram em noites de domingo, no agradável horário das 18h. Atenção para o cartaz, olhe bem o preço da entrada e o valor mínimo de consumação (R$ 2,00). Hoje em dia, em algum bar ou casa de shows, existe algo que custe ao menos dois reais?

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SEM RETORNO
O primeiro rolou no dia 23 de junho de 2002, reunindo as bandas de abertura Lunática (Taubaté) e Overjoyed (Santos), e a atração principal da noite foi o Street Bulldogs (Pindamonhangaba). Lembro que nesse dia o público não foi dos melhores, frustrando talvez um pouco os organizadores, os donos da casa e a mim, que havia visto o Street Bulldogs há tempos, e queria rever os caras em ação. Aliás, até hoje, com a banda inativa, continuo fã dos caras, e sempre achei uma banda que fazia um som vigoroso e autêntico.

Pois bem, os shows de abertura correram sem sobressaltos, no esquemão punk mesmo, com um detalhe que dá arrepios nos músicos mais “profissionais”. Não havia retorno no palco, o que compromete e muito a apresentação de quem leva a coisa a sério. Provavelmente as duas bandas de abertura não reclamaram muito da inexistência do retorno, mas lembro perfeitamente do Street Bulldogs ter reclamado bastante, e seu vocalista, Leonardo, ter demonstrado claramente uma irritação e revolta pela falta de estrutura pro show.

De qualquer forma o som rolou, a galera agitou o que tinha que agitar, bebeu o que tinha que beber, e foi para casa já pensando no domingo seguinte, que seria de Zumbis do Espaço ao vivo, e talvez um dia de alegrias futebolísticas.

DIA DOS MORTOS, DIA DO PENTA
Era 30 de junho de 2002. Domingo. Dia da final da Copa do Mundo que estava rolando do outro lado do globo, no Japão e na Coréia do Sul. O Brasil jogaria às 8h30 contra a Alemanha, valendo para nós, os brasileiros, o quinto título mundial. Para os alemães, era a chance de conquistar o tetra. Naquele dia, à noite, ia rolar Zumbis do Espaço ao vivo no Chopp do Poeta. Acordei 7h00, sonolento tomei um café enquanto assistia as primeiras notícias pela TV, claro falando da partida que pararia o Brasil por 90 minutos. Por volta de 8h00 meu amigo Otávio passou em casa para me dar carona até a casa de outro camarada, chamado Denis, que morava em Tremembé. Lá assistiríamos à final junto de outros amigos da escola (sim, eu era um colegial, terminando o ensino médio, mais cabaço, impossível).

Enquanto conversava sobre o jogo, não me deixava esquecer que a noite, lá no Chopp do Poeta teria o som com os Zumbis do Espaço, uma das minhas bandas prediletas, e seja lá qual fosse o resultado daquela final de Copa, eu estaria lá. Para minha alegria meu xará Ronaldo, o Fenômeno, destruiu os chucrutes com dois gols e levantamos o caneco. O churrasco que se seguiu após a vitória, para comemorar aquele título foi regado à carne barata mal assada por uma molecada, e eu, como não bebia cerveja, traguei uma vodka extremamente barata misturada com refrigerante igualmente vagabundo. Relembre os gols que valeram a vitória e o pentacampeonato mundial.

Lá pelas 14h eu estava levemente breaco devido à birita, e me lembrei que antes de ir ao Chopp do Poeta iria rolar um jogo do E.C. Taubaté, meu time de coração. Veja você que a Federação Paulista de Futebol sempre foi mestre em fazer bizarrices, como marcar um jogo da terceira divisão do campeonato paulista em plena tarde de comemoração de título de Copa do Mundo!

Voltando ao histórico domingo de 2002, eu, como um bom doente pelo Burro da Central, não deixaria de ver aquele jogo. Era a última rodada do Paulista da Série A3, a terceirona paulista. O Taubaté já não tinha chances de mais nada, era apenas para cumprir tabela. E mesmo assim eu tomei um ônibus para Taubaté, depois outra condução até o estádio, para ver Taubaté 0x2 Taquaritinga. Sim, pode me chamar de lunático.

Depois de assistir a um péssimo jogo, claro, fui até minha casa, tomei um banho, vesti uma camisa do Misfits (que tenho até hoje) e peguei um buzão para o centro da cidade. Desci no ponto mais próximo à Rua XV de Novembro, mas tive de atravessar a Praça Dom Epaminondas. Muita gente ainda celebrava o pentacampeonato conquistado naquela manhã de domingo, muitos ainda bebiam cerveja, outros cochilavam nos bancos e a maioria já rumava para casa. Um cidadão embriagado olhou bem para mim, para a minha camisa, para meu rosto novamente e disse: “Ih, esse aí é skinhead”. Abraçou sua companheira, que estava igualmente manguaçada, e seguiram sem rumo, mas felizes.

Mini flayer com programação de shows que rolaram em 2002 no Chopp do Poeta, em Taubaté (imagem gentilmente cedida por Rogério Valladão)

Mini flayer com programação de shows que rolaram em 2002 no Chopp do Poeta, em Taubaté (imagem gentilmente cedida por Rogério Valladão)

Finalmente cheguei ao Chopp do Poeta, onde o clima era de alegria já que 99% dos que lá estavam gostavam também de futebol e estavam felizes pelo título da seleção brasileira. Sobre o show propriamente dito, naquele dia a banda de abertura foi o Food 4 Life , banda que era mais conhecida por ter uma bela loira na bateria do que propriamente pelo seu som., mas tinham boas músicas, e fizeram seu nome naqueles tempos em que o hardcore cantado em inglês ainda era soberano entre as bandas do gênero.

Ingresso do último show dos Zumbis do Espaço realizado em Taubaté, em junho de 2002 (imagem gentilmente cedida por Rogério Valladão)

Ingresso do último show dos Zumbis do Espaço realizado em Taubaté, em junho de 2002 (imagem gentilmente cedida por Rogério Valladão)

Na sequência subiram ao palco os caras da banda Revide (ex-Johnny Cusper, de Tremembé). Fizeram boa apresentação, como sempre, boa presença de palco e sempre bem empenhados em fazer um show enérgico. Aliás, por onde andarão Luciano, Mendel, Cássio e demais integrantes? Mandem notícias!

Era finalmente chegada a vez dos Zumbis do Espaço subirem ao palco. Havia visto os caras ao vivo apenas uma vez, no ano anterior (2001), em Campos do Jordão, num show que já foi relatado aqui neste espaço (para ler esse texto clique aqui). Estava curioso para vê-los novamente, especialmente pelo fato de estarem em plena turnê de divulgação do disco “Aberrações que Somos”, um marco na carreira da banda valeparaibana que tem assombrado o punkrock nacional desde 1996.

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Tor, Zumbilly, Hank Alien e Gargoyle, formação de 2002 dos Zumbis do Espaço

Tor, Gargoyle, Hank Alien e Zumbilly subiram ao palco (desta vez devidamente equipado com retorno) sob aplausos de um ótimo público que compareceu naquela noite de domingo, mesmo a maioria ainda estando de ressaca da comemoração do título Mundial. Ao som de “A Marcha das Almas” eles se apresentaram, e desceram o reio nos clássicos, intercalados com as novidades do disco mais recente, incluindo petardos que viriam a se tornar clássicos poucos anos depois, como “Dia dos Mortos”, “Ouça o Lobo Uivar” e “A Marca dos 3 Noves Invertidos” (assista o videoclipe abaixo). Todos cantados a plenos pulmões pela galera que tornou o acanhado Chopp do Poeta uma sucursal do inferno.

Foi uma noitada das boas, de punkrock, clima amistoso, muita cerveja e confraternização. Curiosamente essa foi a última vez que os Zumbis do Espaço tocaram em Taubaté. Mesmo com o fato do vocalista Tor ser taubateano, e a banda ter ensaiado e gravado por diversas vezes na cidade, nunca mais Taubaté recebeu o horror-punk dos Zumbis. Curiosamente desde então o Brasil não conquistou mais nenhuma Copa do Mundo. Que venha 2014, e que voltem os Zumbis do Espaço para destruir Taubaté.